Ouvidoria vai apoiar novo normal
*Artigo de Maria Inês Fornazaro, presidente da ABO Nacional
Estamos completando 60 dias de quarentena em São Paulo. Em luta contra a pandemia de coronavírus, talvez não percebamos claramente o quanto tem sido inusitados estes dois meses. Ninguém jamais sonhou com tamanha mudança em nossos hábitos, nas atividades econômicas, políticas e sociais.
Ainda é cedo para fazer um balanço do impacto da pandemia em nossas vidas. Sabemos, mas nem gostamos de pensar demais nisso, por enquanto, que a economia sofre fortíssimo abalo, cujas consequências gravíssimas continuarão por muito tempo depois de as coisas voltarem ao normal. Ou melhor, ao novo normal, como especialistas vem afirmando.
Um dos principais instrumentos de comunicação com que o cidadão conta, e irá contar ainda mais nos tempos difíceis que virão, é a ouvidoria. O canal que recebe manifestações críticas e reclamações em segunda instância, esgotados os contatos com os SACs.
Não é prematuro prever que os acessos às ouvidorias vão aumentar muito. Afinal, sairemos desta quarentena bem mais pobres, com desemprego ainda mais preocupante, dívidas e outros problemas, por enquanto empurrados com a barriga porque o foco é, e deve ser, a manutenção da saúde e da vida.
Ouvidores vão ter de se desdobrar para dar conta desta missão adicional. Por atuar há décadas na defesa dos direitos do consumidor, e há 25 anos na associação que congrega ouvidores/ombudsman, não tenho dúvida de que os profissionais da área estão se preparando para esta nova etapa deste instrumento de cidadania.
Tenho conclamado as companhias privadas a fortalecer suas ouvidorias. E, na maioria dos casos, a criar este canal de comunicação. Caso contrário, os atendentes dos clientes terão muita demanda, mas não conseguirão solucionar parte expressiva das insatisfações manifestas pelos que recorrem ao SAC.
É fácil entender por quê. O SAC não tem a autonomia organizacional e funcional da ouvidoria. Trabalha mais vinculado ao marketing. A ouvidoria, por sua vez, faz parte da gestão estratégica das organizações.
Vamos recordar que, na pós-pandemia, as empresas que sobreviverem terão de ser muito bem administradas, com pouquíssima margem para erro, pois os consumidores terão menos renda para comprar produtos e serviços. Falhas nos processos de qualidade poderão ser fatais.
Poucos se lembram (ou sabem) que a ouvidoria é um excelente apoio às melhores práticas e processos, pois recebe o feedback do consumidor. E sempre é melhor corrigir falhas estruturais do que ter de se desculpar por elas. Retrabalho significa pesado custo financeiro e grave dano à reputação empresarial.
Investir em ouvidoria em uma aguda crise econômica? Sim, para que o novo normal seja melhor do que antes e do que agora.
*Publicado na edição de hoje do Diário do Grande ABC